Martins Sensei, in memorian.

martins sensei
José Maria Ribamar Santos Martins (1933-2012)
O introdutor do Aikido no Distrito Federal

 

A estrada

Em dezembro de 1971, depois de uma longa e cansativa viagem de carro pela BR-040 (antiga estrada Rio- Belo Horizonte -Brasília), chegava à Brasília um casal com 3 crianças, uma delas ainda de colo, com três meses.

O que vinha fazer em Brasília, esta família?

Por força de determinação da Direção Geral do Banco do Brasil ele vinha trabalhar na instalação da Gerencia de Operações de Credito de São Paulo (GESAP).

Este homem, Mestre Martins, deixava o Rio e vinha com a família toda para o Planalto Central para abrir uma nova fronteira em sua vida. Mas essa história não começa em Brasília, tampouco no Rio de Janeiro.

O homem e a história

José Maria Ribamar Santos Martins veio de longe, lá de Axixá, terra do bumba-meu-boi, no interior do Maranhão. Logo cedo os pais o levaram para a capital (São Luís) onde o menino virou seminarista. Mas ele não tinha vocação para padre.

Aos 18 anos, depois de servir o Exército, deixou o Maranhão para trás e seguiu para a Capital Federal da época (Rio) com o anseio de uma vida melhor, em busca de arrumar um bom emprego.

Ligado ao esporte foi praticar judô na Praça da Bandeira, centro do Rio. Aplicado, logo chegou à faixa preta 2°Dan com o mestre Yushimasa Nagashima.

Após forte desilusão pessoal com os caminhos que trilhava dentro do Judô, ocasionado por randori na academia, aonde acabou machucando seriamente o insolente desafiante. Por isso, Mestre Martins busca por uma forma de arte marcial onde não precisasse usar de violência.

Em 1965, ele ficou sabendo de um japonês que estava ensinando algo parecido com o que ele buscava. Tratava-se de Teruo Nakatani (introdutor oficial do Aikido no Brasil designado pelo doshu Kishomaru Ueshiba) que, naquela época, ensinava na academia Mehdi, em Ipanema. Este encontro teria um impacto decisivo em sua vida desde então.

Entra para o Aikido e torna-se o principal auxiliar de Nakatani sensei, ajuda na fortemente a implantação da Associação Carioca de Aikido, na R. Barata Ribeiro. Mestre Martins auxiliado ainda pelo Waldemar ajudam Nakatani sensei e a Sakai, massagista recém chegado do Japão.

Em uma destas vezes, acompanhando Nakatani sensei participa de gashuku realizado em Campos do Jordão por Kawai sensei, aonde é promovido a faixa preta, sem antes receber um tapa na cara dado por Kawai que se justifica dizendo que era preciso saber se o mestre Martins era resistente.

Da maresia para o Cerrado!

José Martins saiu do asfalto do Leblon para o cerrado poeirento de Brasília!

Sem esmorecer, com três crianças pequenas, um menino de cinco anos (José Luis), uma menina de quatro anos(Ana Paula) e um bebe de 3 meses (André), encarou o novo desafio!

Com um ímpeto de desbravador, o jovem que saiu do interior de seu estado para crescer, muda-se, nova e definitivamente em busca do sonho de Dom Bosco: Brasília!

No dia de sua chegada em Brasília, como a unidade funcional que iria ocupar ainda estava em obras, se instalou na casa do Coronel Walter Pires.

A chuva e o barro vermelho ainda imperavam na quadra 303 Sul, sem arvores, não havia asfalto, nem meios fios, sem telefone, sem televisão, jornais e revistas chegavam com atraso de semanas, tudo em caráter precário! Só a poeira vermelha flutuava no ar, ocasionada pelos redemoinhos de vento que se formavam na quadra.

À sombra dos ciprestes nas manhãs frias do Cerrado

Em março de 1972, Mestre Martins fixou o Aikido ao Centro Oeste, nos gramados da AABB, a sombra dos ciprestes, as 6:00, ainda escuridão ! Era utilizado o espaço do gramado em frente à churrasqueira do clube. Mestre Martins e Rui Matos chegavam mais cedo, pois tinham que catar as chapinhas de cerveja, e refrigerante, antes de treinar na grama.

Assim, sem dojo, sem tatamis, iniciava-se o Aikido no coração do Brasil.

Logo depois, com a insistência dos praticantes, a AABB comprou tatamis e instalou-os no ginásio de esportes no. 1.

Nas manhãs frias, os praticantes colocavam e tiravam os pesados tatamis pois havia ¬¬ a pratica do futebol de salão que ocupava o mesmo espaço. Uma força de vontade inaudita dirigida pelo Mestre Martins.

Este homem trabalhou, mourejou, estudando a noite no Ceub (Centro de Estudos Universitário de Brasília), e dando aula de Aikido as 6:30 da manha todas terças, quintas e sábado. E formou-se em Direito.

Viu, então, a arte do Aikido começar a vicejar, com a ajuda de Nilson Ruiz, Rui Matos, Rolf Blat e Clovis Albuquerque, no cerrado do planalto central. Mestre Martins Trazia o Nakatani sensei, anualmente, para realizar exames de faixa.

Em 1975, Mestre Martins recebe a visita, em Brasília, do grande mestre Yassuo Kobayashi que, por pedido do professor Nakatani, traz consigo o professor Ichitami Shikanai para prosseguir com o desenvolvimento do Aikido no Brasil. Ocorre que, por situações de trabalho e saúde, o professor Nakatani não podia dar continuidade em seus ensinamentos.

Nesta ocasião cabe relevar a importância de Carlos Lucio Menezes, na época delegado do Departamento de Policia Federal, pelo esforço de angariar fundos para conseguir o cine Brasília para exibição do filme O Poder Defensivo de Aikido (Sonny Chiba, 1975). Este delegado da PF ofereceu almoço- uma feijoada no apartamento dele-, antes da demonstração do mestre Kobayashi, na primeira vista de um mestre japonês internacional a Brasília. Foi difícil fazer a demonstração depois da feijoada brasileira!!

Noutra ocasião, o prof. Santos ligou para Shikanai sensei (no Rio) e este falou que estava tendo dificuldade para retirar a bagagem de emigrante da senhora Mayumi (ex-esposa) na Alfândega do Rio. Vale registrar que ela, Mayumi, veio com visto de emigrante conseguido pelo Adido Naval Paraguaçu, e por lei, ela podia trazer, sem tributos, toda a mudança dela de Tóquio para o Brasil (panelas, louças, roupas, etc.). Na bagagem desacompanhada da emigrante Mayumi constava um teclado musical, moderno, eletrônico.

O prof. Santos toma o avião e vai ao Rio, na Alfândega do Porto do Rio, e procura o despachante que explica que era necessário "molhar" a mão do fiscal porque senão o teclado seria apreendido! O prof. Santos explica tudo isto para Shikanai que não entendeu!

Shikanai perguntou: "Eu tenho direito de lei, não é Santos?"

Vai explicar o "jeitinho brasileiro" para um estrangeiro!

Então, o prof. Santos decidi ligar para o delegado federal Carlos Lúcio na superintendência da PF, em Brasília e surpresa......logo foi liberado o teclado e toda a bagagem da emigrante Mayumi! Curiosamente, mais tarde, o prof. Santos ajuda a vender o teclado eletrônico visto que o casal precisava de dinheiro para o tratamento da filha Minoli.

Uma casa no campo

Vale registrar, que Mestre Martins na década de 80, adquire um sitio próximo a Luziânia, que chamou de "Espera Feliz", aonde realizava animados treinos de Aikido nos fins de semana na quadra de areia de vôlei. É neste sitio que o Mestre Martins se realizava no convívio com o trato da terra. Nestes momentos , Mestre Martins capinava, tratava das arvores, cultivava uma grande horta, o maior contato intimo com a Natureza!

Mestre Martins plantava e as formigas saúvas vinham e devastavam, porém, ele dizia que não era nada, e prosseguia. Aplicava Johei, meditava e prosseguia.

Novas mudanças e crescimento

Mestre Martins tendo uma visão celestial se transfere da AABB para o Clube Cota Mil, aonde vê sua turma crescer com vigor. Neste dojo do Cota Mil, sagrado pela Messiânica, surgem estrelas como João Rego, Rafael, André Boechat, e Anderson, dentre outros. É neste dojo que o Mestre Martins vê realizado o seu grande sonho do Aikido no Planalto Central.

Mestre Martins transcendeu no dia 10 de abril de 2012, às 22 horas.
por: J.F.Santos - Instituto Cultural Teruo Nakatani-ITN